A recente decisão do governo da Coreia do Sul de proibir o comércio de carne de cachorro desencadeou uma série de preocupações que vão além da extinção de um setor tradicional. Com a promulgação da nova lei, mais de meio milhão de cães enfrentam um destino incerto, que alterna entre a esperança de resgate e a cruel possibilidade da eutanásia.
O reverendo Joo Yeong-bong, que até então conciliava seu ministério com a criação de cães para abate, se vê no centro dessa tempestade de mudanças. Ele e outros criadores têm até fevereiro de 2027 para se adequar à proibição, mas muitos argumentam que o prazo não é suficiente para desmantelar o que sempre foi seu sustento. “Estamos tentando vender nossos cães há mais de um ano, mas eles não têm saída”, conta Joo.
O contexto se complica ainda mais com os desafios logísticos e sociais enfrentados para realocar esses animais. Raças grandes e estigmatizadas, como a tosa-inu, permanecem impróprias para a maioria das famílias sul-coreanas, que geralmente vivem em apartamentos compactos. Enquanto os abrigos locais já lutam contra a superlotação, as autoridades prometem fundos e expandir as suas capacidades.
A transformação cultural que resultou na quase extinção do consumo de carne de cachorro reflete as tendências globais de direitos dos animais e alimentação sustentável. No entanto, a responsabilidade sobre o destino dos cães remanescentes ainda é um ponto nebuloso. Desde o fechamento de 623 das 1.537 fazendas, fala-se de exportar os animais para países onde a adoção é mais comum, mas o processo é vagaroso e, por vezes, demasiado custoso.
A controvérsia atinge inclusive ativistas dos direitos dos animais, que frente à impossibilidade de resgate total, já cogitam a eutanásia como única solução. Uma indagação que ecoa entre os envolvidos é sobre quais alternativas podem ser desenvolvidas para garantir que esses animais, antes vinculados a tradições antigas, possam terminar suas vidas com dignidade.
Essa encruzilhada não apenas amedronta os criadores de cães, mas também lança uma sombra sobre outros setores agrícolas cujas práticas mandam tradição e sustentabilidade em confronto. Enquanto a legislação continua avançando, criadores como Chan-woo e Joo expressam sua profunda incerteza sobre o futuro econômico e psicológico que os aguarda.
Com isso, a Coreia do Sul abre precedentes para debates mais amplos sobre ética alimentar e direitos dos animais, obrigando uma sociedade moderna a redefinir seus limites éticos e suas formas de subsistência. Uma solução única ainda parece estar longe de ser alcançada, mas levar em consideração a totalidade de impactos humanitários e animais será essencial para evitar que o fim desse setor se transforme em um dos capítulos mais sombrios da história recente.



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